quarta-feira, 22 de junho de 2011

ATENÇÃO: OBRAS NO CAMINHO !

A derrota de Pinto de Sousa em 05 de Junho foi tão expressiva que fiquei sem palavras. Depois de afastado Sousa, senti que cumpri o meu dever de intervenção pela palavra e voltei à rotina – em tempo, o resto “iria parar ao seu lugar”.
A derrota teria sido realmente expressiva se a abstenção fosse historicamente baixa – mas foi 100 mil eleitores mais alta. Houve mais 50.000 votos em branco, que ninguém sabe interpretar. Isto é, os portugueses, colectivamente, não estiveram à altura das circunstâncias. Continuarão a dizer mal dos políticos e “da situação”, pouco ou nada fazem para a melhorar, e esperam que os tais “maus políticos” a mudem… Voltarei a esta questão, pela racionalidade do eleitor, que sabe que é baixa a probabilidade de o seu voto individual alterar os resultados, mas que opera um dilema moral.
De facto, é precipitado falar em afastamento de Sousa. Um sujeito que tanto se preocupou com a (sua) imagem e com o controlo da agenda mediática até pode ter sido sincero no discurso de demissão e a cumprimentar os recém-empossados ministros – mas quem acredita? Não posso deixar de prever que só o fez para ter imagens gravadas para recuperar quando desejar voltar a cargos políticos – ou tão-só aliviar a pressão de processos judiciais…
Os votos revelaram desejo claro de mudança, e todos o percebemos. Sem sabermos uns dos outros, concluímos colectivamente que Sousa não!; que é cedo para voltar a dar uma maioria absoluta a um partido; que Paulo Portas está 50.000 votos mais credível; que Louçã se tornou residual. E, claro, que o PCP continua a ter 400-450 mil votantes nos mesmos locais.
Mas os votos ainda revelaram, para meu grande gozo, como tantos jornalistas e comentadores são ignorantes ou manipuladores. Avisei vários directamente dos erros que cometiam com as suas afirmações sobre “sondagens”; e quase todos ignoraram a exigência de rigor: chamaram sondagens a projecções, enganaram muita gente e submeteram-se à lógica mediática de Sousa – mas os eleitores derrotaram-nos. À conta dessas “sondagens”, “viram tiros no pé” de PPC a cada momento, elogiaram Portas pelo seu “crescimento” e deixaram as mentiras de Sousa em paz. Quando são tão críticos dos banqueiros e do seu papel na crise financeira, deviam sentir o que exigem dos outros: estes comentadores e jornalistas ignorantes ou que actuaram de má-fé devem ser mais regulados (e punidos) ou despedidos, por danos causados à sociedade. Mas, tal como os políticos fazem as regras que os governam, os media colocam-se acima das críticas que fazem aos outros.
Vendo bem, Sousa conseguiu com a “cassete” evitar o descalabro que até no PS se sabe que foi a sua governação (pelo menos) desde 2009. Fez o mesmo que o PCP fez desde o colapso da URSS (1991): com uma “cassete” que ignora a realidade e conta uma narrativa de ilusões, conseguiu que o seu eleitorado nuclear não se desfizesse, evitando a perda de receitas futuras que isso implica para o PS. Se observarmos os militantes, ingénuos e fanáticos que o apoiam (e ainda são um milhão e meio), Sousa conseguiu evitar o previsível colapso que os (merecidos) precedentes da Grécia (2009) e da Irlanda (2010) anunciavam. Garantiu um resultado muito frustrante para muitos socialistas, e para muitos parasitas do Estado, mas garantiu lugares para vários no parlamento, poupando-os a terem de enfrentar os empregos que deixaram, e a terem de explicar agora a divergência entre o que andaram a dizer antes e o que fizeram no poder. Mas não arranjou assento para quem dele mais precisava e, de entre eles, mais merecia, Teixeira dos Santos; com este “despejo”, Sousa, os seus apoiantes e o PS revelaram a fraqueza de valores morais que os move: desprezaram a lealdade, a obediência (a subserviência!) e a expectativa de minorar o desastre – só a utilidade eleitoral vale. Para Sousa voltar ao poder no futuro, terá de convencer todos os que interiorizarão este “despejo” que ele não os tornará a seu tempo também o seu “bode expiatório”; não vai ser fácil, mas é verdade que o poder cega tanta gente de moral tão fraca, que aceitam o que for preciso para lá chegar (ao contrário do que tantos dizem, não só na política, como a expressão “não estou para me chatear” sugere).
Do candidato Fernando Nobre pouco ou nada ficará para a história, que apenas registará a por todo o país bem recebida eleição da deputada Assunção Esteves para Presidente da Assembleia da República. Espero que não se volte a cair na tentação de prometer cargos para obter apoios “sumarentos” – mas todos sabemos que “a carne é fraca” e aplicar os valores morais que se declara tem custos.
PPC e o seu Governo tomaram posse. Como é usual nestas ocasiões, anunciou coisas novas. E comprometeu-se a cumprir o “Memo da Troika”; não se lhe pede menos – mas eu espero mais. O “Memo da Troika” tem fins liberalizantes, essenciais para desenvolver Portugal; nenhum país se desenvolve com socialismo. Quando criticamos o laxismo e o facilitismo, não há alternativa a dar espaço à iniciativa individual e à responsabilização do indivíduo. Quando pretendemos reduzir o défice e a dívida públicos, não há alternativa à redução da intervenção do Estado. Por exemplo, privatizando empresas e simplificando ou reduzindo custos de processos burocráticos (voltarei à questão das privatizações, que estudei, como é do domínio público). Mas a minha simpatia por PPC e quase todos os seus ministros, e pela agenda liberalizante da “Troika” (e certamente do Governo), não me torna defensor cego desta maioria nem deste Governo; não esqueço a dedicatória de Hayek, no seu livro de 1944, “To the Socialists of All Parties”, e desejo que os novos ministros não caiam na tentação de ver o Estado como uma fonte de recursos para sustentar interesses sectoriais – que estão por todo, mesmo todo, o lado.
Com a Grécia no estado em que está, vai Portugal superar esta crise?
Primeiro, aposto que 99% ou mais de quem fala entre nós sobre a Grécia (ou sobre a Irlanda; ou sobre a Islândia) sabe do que lá se passa pelos media – ou seja, pouco sabe de relevante. Por exemplo, poucos terão a noção de que o PIB da Grécia já cresceu em 2011, e que há muito para privatizar, embora haja muitos interesses sectoriais a oporem-se – com a dívida pública a crescer a um ritmo superior ao crescimento nominal do PIB, isso anuncia um futuro sombrio. É tempo de privatizar, não é tempo de defender direitos adquiridos, porque são insustentáveis.
Segundo, é imoral o devedor pressionar pela reestruturação das suas dívidas sem mostrar que fez esforços razoáveis para a controlar e reduzir. É imoral, sobretudo naqueles que usam uma linguagem moral, apelando à justiça na economia ou a valores éticos na vida em sociedade; e revela a sua insinceridade e como a linguagem moral é só um instrumento político-eleitoral. E é imoral porque quem se endividou reflectiu pouco nos compromissos que assumiu.
Terceiro, sim, Portugal vai superar esta crise. É a vantagem de ter quase um milénio de história – já quase tudo aconteceu antes e tudo acabou por se resolver sem a nação desaparecer. Sob a pressão de ter que corrigir o caminho, os portugueses continuarão a ser como são, a culpar os outros, a “fazer um choradinho”, a “arrastar os pés”, mas lá se adaptam às circunstâncias e, sob pressão externa, vão fazer o que tem de ser feito.

3 comentários:

  1. Irretocável !
    Parabéns meu Caro Amigo.
    Um abraço.

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  2. Sim, Portugal vai superar esta crise como superou outras...mas temos que deixar de ser pequeninos a pensar, medíocres nos comentários... veja bem:o PPC mandou trocar os bilhetes de avião para classe turística.Certo? certíssimo - fez o que lhe competia e era esperado pelos que o apoiam. Mas a quantidade de sorrisos irónicos... Há um membro do governo que se desloca de scooter para as reuniões... mas a quantidade de sorrisos irónicos...Claro que vamos sair da cries mas uma barrela mental fazia tão bem...

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  3. Gosto do seu pensamento, que é mesmo pensmaento (!), isto é, que vai para além da repetição dos chavões, de que estamos cansados, da grande maioria dos comentadeiros deste pais!
    Um abraço
    PS - E gosto do nome do seu blog, talvez por ter nascido e vivido uma parte da minha vida numa ilha, no meu do Atlântico...

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